segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Reportagem do Saia Justa sobre o "New Behaviorismo". Ma che?

O programa Saia Justa veiculou uma reportagem sobre um tal "New Behaviorismo". Depois de apresentar porcamente o que seria o behaviorismo - vide vídeo abaixo, nem vou falar muito -, Lúcia Guimarães, a apresentadora com fumaças de psicóloga, diz que as pessoas estão voltando a tentar se conformar aos padrões, como o que o behaviorismo teria tentado fazer. Daí vem o conceito de "desemperramento" da entrevistada Susan Schuman, e mais um monte de bobagens auto-ajuda em que confesso que prestei pouca atenção. (Ela nem fala de behaviorismo em si - e não me parece que fala recorrentemente sobre isso, mas fala dos arquétipos, nem sei se junguianos ou o que diabos ela tá tentando dizer - enfim, o problema é outro).

Behavioristas radicais, estes seres temíveis.

Com os erros do começo já deu pra ir se indignando e mandando uma cartinha amigável pro GNT. Segue o link do vídeo aqui e a nota que enviei para o Saia Justa:


Gostaria de tecer alguns comentários sobre a reportagem do Saia Justa intitulada "New Behaviorismo", trazendo uma entrevista com Susan Schuman, sobre o método endossado por esta.

A introdução traz uma crítica ao Behaviorismo Radical, no entanto numa concepção que recicla preconceitos e comete erros básicos quanto à teoria. A começar, o filme "Laranja Mecânica" não faz referência ao behaviorismo radical no tratamento dispensado à Alex, e sim à reflexologia do fisiólogo russo Ivan Pavlov. Este ganhou um prêmio Nobel pela descoberta dos reflexos condicionados, e nunca foi psicólogo, nem delineou aplicações do seu trabalho para a psicologia. (A referência infelizmente errônea ao trabalho de Pavlov é clara quando se leva em conta o nome e o sotaque russo do terapeuta, Dr. Brodsky).

Os trabalhos de Pavlov posteriormente influenciaram a psicologia, especialmente a escola behaviorista. Skinner, ao contrário do que foi mencionado, não foi "defensor" e sim fundador do chamado behaviorismo radical. A palavra "radical" não se refere a um "radicalismo" pueril como o termo pode sugerir, mas sim à "raiz" dos comportamentos: ele se interessou por saber o que nos faz aprender e modifica nossa conduta, incluindo aí considerações sobre a forma como pensamos, nossas percepções e preferências, nossas práticas éticas, culturais e políticas, e denunciou as formas de controle sob as quais nossos comportamentos estão, sem que nos demos conta. Entre estes, formas de controle autoritário como as que são repudiadas pela reportagem. Skinner era contra formas aversivas de controle como as mostradas no filme e reiterou isso em diversos livros: a saber, Ciência e Comportamento Humano, Walden II e Beyond Freedom & Dignity (no Brasil, "O Mito da Liberdade", título parcamente traduzido).

A teoria behaviorista radical é responsável por grandes avanços na terapia comportamental, na psicologia da educação etc. É reconhecida internacionalmente no tratamento a autistas e pessoas com dificuldades de desenvolvimento. É triste ver a teoria reduzida a preconceitos levianos por uma reportagem que se propõe a apresentar mais uma leva de conceitos de auto-ajuda sem respaldo científico algum para lidar com problemas com os quais o behaviorismo já aplica o método científico com rigor há décadas. Por isso, expresso meu pesar e fico à disposição para indicar profissionais e associações que podem apresentar a teoria behaviorista aos espectadores.

Att.,
Aline G. Couto - Psicóloga pela UFBA

Eu ia escrever bem mais coisa, citar a ABPMC e me apresentar direito, mas infelizmente o formulário que disponibilizam pra enviar contato tem limite de caracteres e não coube. Enfim, quem tiver a fim de encher o saco também, este é o formulário.

Não sou de me indignar com esse tipo de bobagem que costumam falar sobre behaviorismo radical. Quem me conhece sabe que só dou risada e deixo passar. Mas é complicado. A gente vive sob ataque e quem tem consultório ou conversa com alguém tem de falar em behaviorismo "quase pedindo desculpas", como disse a Maly Delitti num curso que fiz uma vez. Mães deixam de levar os filhos autistas à terapia ABA porque ouvem as coisas mais cabeludas sobre a psicologia comportamental. Fora a resistência do meio psi, que contribui pra ir prolongando ad aeternum a pecha de malvados, frios, mecanicistas e positivistas sem coração.

Não custa tentar esclarecer as coisas de vez em quando. Efeito pode ser que não haja nenhum, mas não tentar também não deve ajudar. VAI PLANETA!

2 comentários:

  1. Aline, muito boa defesa que vc fez de Skinner e de seu legado. Você disse bem, a reportagem não é só mau feita, ela é leviana de fato. Essa metodologia de auto-ajuda hi-tech, é totalmente mercadológica, nunca foi científica, concordo mesmo contigo. E o que essa Susan propões auto-ajuda hi-tech? até onde o mentalismo leva estes pseudo-cientistas?

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